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Lembranças além do cárcere

Lembranças além do cárcere

Lembranças além do cárcere

Lembranças além do cárcere

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Conheci Ana Cristina nas ruas da Santa Luzia, ocupação na cidade Estrutural. Ela sempre me cumprimenta com um sorriso aberto e abraços fáceis. Me chama de mulherzinha e pergunta como andam os meus dias.

Ela foi fonte de informação para mim em outras reportagens, durante o curso de jornalismo. Já falou sobre política e como é morar naquele local. Mas nunca sobre o seu passado, que a deixou marcas profundas e permanentes. Foi em uma dessas entrevistas que eu fiquei sabendo que ela já cometeu um crime e passou 10 anos na Penitenciária Feminina do Distrito Federal.

“Eu fui criada assim, bateu levou”

Ana Cristina Rodrigues Silva, 45 anos, é mãe de quatro filhos, e hoje mora na comunidade de Santa Luzia, na região da Estrutural. A maranhense nasceu em Passagem Franca, cidade localizada 400 quilômetros da capital São Luís, e foi para o Goiás quando tinha 12 anos. Fugiu com o pai do seu primeiro filho, com o sonho de construir uma família e viver feliz ao lado do homem que amava.

O local que foi palco de seu amor, também se tornou o de uma tragédia, onde ela cometeu o seu crime. A maranhense conta que decidiu ir ao Maranhão visitar a sua família. Na época, estava grávida. Ao voltar, o seu então marido havia vendido os seus pertences e já estava com uma outra mulher.

“Ele vendeu minhas coisas. Vendeu a minha casa. E eu tava no Maranhão. Eu nem sabia que tava grávida. Foi um momento triste. Ele falava que eu era uma cascavel. Mas hoje eu tenho a minha idade e eu fui criada assim, bateu levou. Fui criada na minha família assim.”

Ela compartilha que, assim que chegou de viagem, viu o ex-marido andando de carro com algumas mulheres. Tomada pela raiva, Ana Cristina pediu uma arma emprestada a seu vizinho. Ela, então, entrou na casa em seu marido estava com uma dessas mulheres e atirou nos dois. A mulher morreu na hora, ele não.

Após efetuar o crime, ela não pensou em fugir ou se esconder. Logo se entregou para pagar pelo o que havia cometido.

Grávida no presídio

Ana Cristina tinha 20 anos e estava grávida de seu primeiro filho. Mas também estava presa. Ela dividia a cela com mais 5 mulheres que também estavam grávidas. Ela descreve que a gravidez lá dentro não foi boa. Que era uma sensação ruim estar grávida naquele lugar. Ela se via triste a todo momento, não podendo curtir o seu tão esperado filho.

“No banho de sol eram só grávidas. Eu não tinha visita. Tinha só uma velhinha que ia lá visitar a filha que estava grávida e ela levava alguma coisa pra mim. Eu não tinha ninguém por mim”.

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Mesmo se sentindo sozinha, ela não queria que seu filho ficasse com ela naquele local. Ela não teria como dar todo o cuidado que um recém-nascido precisa. O seu parto foi cesárea e, assim que recebeu alta, pediu para que a avó da criança a levasse com ela. Ato esse que, muitas vezes, fez o filho se voltar contra ela – ele afirma que foi abandonado por sua mãe.

A ex-detenta sempre se viu muito sozinha. Em todos os momentos de sua vida. Assim, ela aprendeu a não esperar nada de ninguém. Fruto de sua infância, onde não havia uma família que a acolhesse realmente. Sua mãe morreu em seu parto e seu pai a colocou para morar com outros parentes, e, assim, ela foi vivendo de casa em casa. 

Ana Cristina garante que já passou fome em sua vida. E, lá dentro da cadeia, fez uma promessa para Deus: ela iria ajudar a quem tem fome.

Solidão

Ressocialização

O seu primeiro trabalho após conseguir a sua tão esperada liberdade, foi de serviços gerais em um hospital no Plano Piloto. Na época, ela estava em regime semiaberto. Compartilha que era rotina receber a visita de um policial em sua casa para saber como estavam as coisas.

Ela não sente vergonha em falar sobre quem ela foi e sobre quem ela é. Ao contrário, ela tem orgulho da mulher que se tornou e das pessoas que ela consegue ajudar por meio das doações que arrecada. Já presenciei Ana Cristina entregar alimentos, roupas, brinquedos e até materiais de construção para seus vizinhos, tudo conseguido por meio de seus doadores, como ela os chama.

Reportagem produzida para o Trabalho de Conclusão de Curso da faculdade de jornalismo do Centro Universitário de Brasília - Ceub

 

Textos e website: Maria Luíza Souza

Imagens: Maria Luíza Souza e Mariana Tollendal

Orientação: Luiz Claudio Ferreira 

Coordenador do curso de jornalismo do Ceub - Manoel Henrique Moreira

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